Breve História do Cargo

A carreira de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil é antiquíssima dentro da Administração Pública brasileira e, como de se esperar, é resultado do próprio processo de formação do Estado, que sempre teve que contar com uma estrutura tributária e aduaneira para angariar fundos necessários ao seu custeio.

A carreira de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil é antiquíssima dentro da Administração Pública brasileira e, como de se esperar, é resultado do próprio processo de formação do Estado, que sempre teve que contar com uma estrutura tributária e aduaneira para angariar fundos necessários ao seu custeio.

Os primeiros ancestrais das autoridades fiscais atuais foram os donatários das capitanias hereditárias, criadas em 1532 e efetivamente implantadas em 1534, que tributavam seus colonos ao mesmo tempo em que pagavam direitos à Coroa portuguesa. Posteriormente, os Regimentos de Fazenda de 17/12/1548 criaram a função de Provedor-Mor da Fazenda Real do Estado do Brasil e os cargos de Provedores de Capitanias, responsáveis pela cobrança dos direitos alfandegários e fiscalização do movimento comercial.

A primeira menção ao termo “Fiscal” para designar determinada autoridade tributária do Governo Colonial surgiu no Alvará de 03/12/1750, que determinou que cada Comarca ou Casa de Fundição das Minas Gerais fosse dirigida por um Intendente e um Fiscal, auxiliados por um Meirinho e um Escrivão. A centralização da Administração Tributária no país só se deu, contudo, pelo Alvará de 28/06/1808, pouco após a chegada da família real ao Brasil, que criou o Erário Régio e estabeleceu a formação de três Contadorias Gerais.

Especificamente sobre a área aduaneira, após a abertura dos portos em 1808, a estrutura de controle sobre o comércio exterior brasileira se mostrou incapaz de fazer frente ao novo fluxo de mercadorias, razão pela qual, via Decreto de 19/05/1818, foi criado o primeiro dos Conferentes de Alfândega, autoridades aduaneiras da época. Em seguida, já com o país independente, organizou-se, via Lei de 04/10/1831, o Tribunal do Tesouro Nacional, com o Ministro da Fazenda como Presidente e o Inspetor Geral como Vice-Presidente, ficando abaixo os Inspetores de Fazenda, autoridades fiscais responsáveis por chefiar as Tesourarias das Províncias.

As primeiras menções a certas terminologias importantes para a construção histórica da carreira surgem nos anos seguintes. O Decreto nº 355/1844 é o primeiro ato a se referir aos “Agentes Fiscais” incumbidos da fiscalização tributária federal. Após, o Decreto nº 2.486/1859 é a primeira norma a usar o termo “Polícia Fiscal” para tratar das autoridades responsáveis pelo controle aduaneiro. Por fim, o Decreto nº 10.319/1889 foi o primeiro ato que utilizou a já hoje consagrada expressão “autoridade aduaneira”.

Com o fim do Império em 1889, houve nova reestruturação da estrutura fazendária, com o desmembramento do Tribunal do Tesouro Nacional, por meio do Decreto nº 1.166/1892, em dois órgãos: o Tesouro Federal e o Tribunal de Contas. Em locais com Alfândegas, chefiadas por Inspetores, extinguem-se as Tesourarias, para que não haja sobreposição de unidades. São criadas algumas Delegacias do Tesouro, dirigidas por Delegados Fiscais. Apesar de já existir desde 1841 uma carreira de Procurador da Fazenda Nacional, tais servidores ficam lotados, juntamente com as autoridades fiscais, no Tesouro Federal, integrando a Diretoria do Contencioso.

As Tesourarias das Províncias (agora, Estados) que sobreviveram à reestruturação de 1892 foram definitivamente substituídas, via Decreto nº 2.807/1898, por Delegacias do Tesouro, de onde se origina o atual (e datado) nome das unidades de tributos internos da Receita Federal. Na sequência, finalmente o Decreto nº 2.998/1898 (Regulamento do Imposto de Consumo, ancestral do atual Imposto sobre Produtos Industrializados) traz a primeira menção ao cargo de Agente Fiscal do Imposto de Consumo, primeira das três carreiras fiscais que formarão o cargo de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil.

O Tesouro Federal formado em 1892 tem vida curta, sendo transformado na Administração Geral da Fazenda Nacional pela Lei nº 2.083/1909, subdividida em Diretorias do Tesouro e uma Procuradoria Geral da Fazenda Pública. Seguem existindo as Alfândegas e as Delegacias, bem como unidades menores, como Mesas de Rendas, Coletorias e Recebedorias. Com a criação do Imposto sobre a Renda pela Lei nº 4.625/1922, é feita a primeira referência ao Agente Fiscal do Imposto de Renda, que só apareceria efetivamente anos depois.

Cerca de 25 anos após sua transformação, já na Era Vargas, a Administração Geral da Fazenda Nacional se torna a Direção Geral da Fazenda Nacional por força do Decreto nº 24.036/1934. Dois anos depois, a Lei nº 284/1936 trata dos quadros do Ministério da Fazenda, com destaque para: Tesouro Nacional, Tribunal de Contas, Recebedorias Federais, Delegacias Fiscais, Alfândegas, Agências Fiscais, Coletorias, Fiscalização do Imposto do Consumo, Diretoria do Imposto de Renda e Contadorias Seccionais.

A fiscalização do Imposto sobre a Renda, praticamente inexistente desde 1922, finalmente é instituída, com a criação, pelo Decreto-Lei nº 1.168/1939, do Serviço Permanente de Fiscalização do Imposto de Renda, a cargo de um corpo de Peritos-Contadores, posteriormente denominados apenas Contadores. No mesmo ano, o Decreto-Lei nº 1.847/1939 inclui no Quadro Permanente do Ministério da Fazenda os integrantes dos cargos de Agente Fiscal do Imposto de Consumo (Quadro de Fiscalização do Imposto) e de Escrivão e Coletor (Quadro de Coletorias). Em seu anexo, cria-se a carreira de Polícia Fiscal, resultado da junção dos cargos de Fiscal, Guarda Fiscal, Guarda Aduaneiro e Sargento Aduaneiro. Conferentes de Alfândega seguem existindo.

O Decreto-Lei nº 8.539/1946 altera a denominação dos integrantes da carreira de Polícia Fiscal para Fiscais Aduaneiros. Após, a Lei nº 830/1949 é o primeiro ato a nomear o antigo Tribunal de Contas como Tribunal de Contas da União. Apesar de ainda constar no rol do Ministério da Fazenda na redação da Lei nº 284/1936, o Tribunal de Contas é inserido na parte relativa ao Poder Judiciário na Constituição de 1937 e, na Constituição de 1946, passa a integrar o capítulo do Poder Legislativo, o que reforça a interpretação de que, desde 1937, já não mais compunha o Ministério da Fazenda.

Via Lei nº 2.642/1955, a Procuradoria Geral da Fazenda Pública é reorganizada nos moldes atuais, denominada Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, saindo da Direção Geral da Fazenda Nacional e ficando subordinada diretamente ao Ministro da Fazenda. Pouco depois, a Lei nº 3.470/1958 cria efetivamente a carreira de Agente Fiscal do Imposto de Renda, transformando nesta os integrantes dos cargos de Contador e Oficial Administrativo lotados na Divisão do Imposto de Renda.

Já contando com o que convencionou-se chamar de “tripé da fiscalização federal” (Agente Fiscal do Imposto de Consumo, Fiscal Aduaneiro e Agente Fiscal do Imposto de Renda), a Lei nº 3.780/1960 cria o Grupo Ocupacional Fisco, composto dos cargos de Agente Fiscal do Imposto de Consumo, Agente Fiscal do Imposto de Renda, Fiscal Aduaneiro, Fiscal Auxiliar de Impostos Internos, Coletor, Escrivão de Coletoria, Auxiliar de Coletoria e Guarda Aduaneiro. Conferentes de Alfândega não integram a lista, o que fortalece a tese de que essa posição consistia, ao menos no final de sua vida útil, em cargo de confiança.

O Decreto nº 50.440/1961 faz a primeira referência ao Agente Fiscal do Imposto Aduaneiro, que passa a substituir a carreira de Fiscal Aduaneiro. Três anos depois, já na Ditadura Militar, a Lei nº 4.502/1964 transforma os Agentes Fiscais do Imposto de Consumo em Agentes Fiscais de Rendas Internas. No mesmo ano, via Lei nº 4.503/1964, Coletores e Escrivães de Coletoria são transformados em Exatores Federais, Auxiliares de Coletoria são transformados em Auxiliares de Exatoria e Fiéis do Tesouro passam a integrar o Grupo Ocupacional Fisco.

Na área previdenciária, o Decreto-Lei nº 72/1966 unificou os Institutos de Aposentadoria e Pensões de cada categoria profissional no Instituto Nacional de Previdência Social – INPS (hoje, Instituto Nacional do Seguro Social – INSS). Assim, os Fiscais e Inspetores de Previdência de cada Instituto passaram a atuar sob a égide do INPS. Pouco depois, 13 anos após a formação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, finalmente foi criada a Secretaria da Receita Federal, com estrutura próxima à atual, resultado da transformação da Direção Geral da Fazenda Nacional pelo Decreto nº 63.659/1968.

O primeiro passo na mudança do Grupo Ocupacional Fisco para o Grupo Tributação, Arrecadação e Fiscalização é dado pelo Decreto-Lei nº 788/1969, que cria o cargo de Técnico de Tributação, de nível superior, que não se confunde com o cargo auxiliar de Técnico de Atividades Tributárias que viria a ser concebido em 1982. O concurso público para a carreira foi realizado no mesmo ano, sob organização do Centro de Treinamento e Desenvolvimento do Pessoal do Ministério da Fazenda, criado pelo Decreto nº 60.602/1967 e transformado na Escola de Administração Fazendária pelo Decreto nº 73.115/1973. Foram cobradas questões de Economia, Direito, Português, Inglês, Estatística e Contabilidade, selecionando pessoal jovem e altamente qualificado que a imprensa, à época, chamou de “meninos do Delfim”, em referência ao Ministro da Fazenda.

Por meio do Decreto-Lei nº 1.024/1969, o “tripé da fiscalização federal” (cargos de Agente Fiscal de Rendas Internas, do Imposto de Renda e do Imposto Aduaneiro) foi fundido na carreira de Agente Fiscal dos Tributos Federais. Os cargos de Fiscal Auxiliar de Impostos Internos e Guarda Aduaneiro foram colocados em quadro suplementar, extintos na medida em que vagassem, o que deixou a instituição alijada de cargos de apoio. Concluída tal etapa, passou-se à estruturação do Grupo Tributação, Arrecadação e Fiscalização pelo Decreto nº 72.933/1973, composto dos cargos de nível superior de Fiscal de Tributos Federais (resultado da transposição dos Agentes Fiscais dos Tributos Federais), Controlador da Arrecadação Federal (oriundo da transformação, dentre outros, dos Exatores Federais e Fiéis do Tesouro), Técnico de Tributos Federais (resultado da transposição dos Técnicos de Tributação), Fiscal de Contribuições Previdenciárias (oriundo da transposição dos Inspetores de Previdência e Fiscais de Previdência) e Fiscal de Tributos de Açúcar e Álcool. Técnicos compunham o núcleo de Tributação, Controladores, o de Arrecadação, e Fiscais compunham o núcleo de Fiscalização.

Por motivo de conflito entre Fiscais e Técnicos de Tributos Federais, pois os segundos recebiam melhor do que os primeiros (ingressavam no que seria hoje a classe especial, enquanto os Fiscais tomavam posse na segunda classe), bem como pela inadequação na nomenclatura dos Técnicos, usual para designar cargos de nível médio e não de nível superior, o Decreto nº 76.346/1975 acabou por extinguir o cargo de Técnico de Tributos Federais e transpôs seus titulares para a carreira de Fiscal de Tributos Federais. Anos depois, via Decreto nº 87.324/1982, houve a criação e inclusão, no Grupo Tributação, Arrecadação e Fiscalização, do cargo de Técnico de Atividades Tributárias, responsável por atividades de nível médio de apoio operacional. Corrigiu-se, com isso, a erradicação dos auxiliares, oriunda do comando do Decreto-Lei nº 1.024/1969.

Durante a redemocratização, editou-se o Decreto-Lei nº 2.225/1985, que criou a Carreira Auditoria do Tesouro Nacional, composta pelos cargos de Auditor-Fiscal do Tesouro Nacional (nível superior, resultado da transposição dos Fiscais de Tributos Federais e Controladores da Arrecadação Federal) e de Técnico do Tesouro Nacional (nível médio, oriundo da transposição dos Técnicos de Atividades Tributárias). Anos depois, a Medida Provisória nº 1.915/1999, convertida na Lei nº 10.593/2002, reestruturou a Carreira Auditoria do Tesouro Nacional em Carreira Auditoria da Receita Federal. Auditores-Fiscais do Tesouro Nacional foram redesignados Auditores-Fiscais da Receita Federal e Técnicos do Tesouro Nacional passaram a ser chamados Técnicos da Receita Federal. Passou-se a exigir curso superior para ingresso como Técnico (sem modificar a natureza de suas atribuições, de média complexidade) e Fiscais de Contribuições Previdenciárias (do antigo Grupo Tributação, Arrecadação e Fiscalização) foram designados Auditores-Fiscais da Previdência Social.

Já próximo ao momento atual, a Lei nº 11.457/2007 transformou a Carreira Auditoria da Receita Federal em Carreira de Auditoria da Receita Federal do Brasil. Cargos de Auditor-Fiscal da Receita Federal e Auditor-Fiscal da Previdência Social se fundiram no Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, atual autoridade tributária e aduaneira da União, enquanto cargos de Técnico da Receita Federal foram transformados em Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil. Por fim, a Medida Provisória nº 765/2016, convertida na Lei nº 13.464/2017, transformou a Carreira de Auditoria da Receita Federal do Brasil na Carreira Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil e eliminou a hifenização do cargo de Analista. Ressalta-se, contudo, que apesar de o nome “carreira” denotar progressão ou promoção entre os cargos, tal provimento derivado é vedado desde a égide da Constituição Federal de 1988, o que torna seus integrantes incomunicáveis e independentes. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal lavrou acórdão fixando a exegese de que os cargos de Auditor-Fiscal e Analista Tributário configuram carreiras distintas, que não se confundem.